quinta-feira, 3 de novembro de 2016

PREOCUPAÇÕES COM O C.E.T.A

PREOCUPAÇÕES COM O C.E.T.A.

O CETA ( Comprehensive Economic and Trade Agreement ), para os menos atentos aos negócios internacionais, é um tratado de comércio e investimentos entre a União Europeia e o Canadá cujo texto foi há dias assinado pelos negociadores, mas que ainda carece de ratificação pelos Parlamentos nacionais da UE, para entrar em vigor. Esteve recentemente na crista da onda de notícias porque o parlamento regional da Valónia, na Bélgica, esteve muito renitente a dar o seu acordo ao texto proposto. Não foram divulgadas na imprensa portuguesa quais as razões dos valões, mas soube-se que ao fim de muitas pressões ( talvez do género “se não comes o peixe também não comes a sobremesa e vais para o quarto escuro”) os belgas regionais renderam-se.
Não sei se em Portugal alguém, para lá dos que têm obrigação de o fazer, já leu o texto completo do Acordo. Pode ser visto, por exemplo, num sítio da internet chamado “CETA General Draft”. Está escrito em inglês e consta de 1598 páginas. Para alem do Governo e das Oposições, penso que os chamados Parceiros Sociais, os comentadores dos meios de comunicação social, os economistas, os juristas com interesse na matéria, os constitucionalistas o deveriam ler, para poderem dar um contributo de ideias antes da ratificação pela Assembleia da República.
Com a atenção despertada por artigo do Sr. Reiner Hoffmann, Presidente da Confederação dos Sindicatos Alemães, DGB, que apareceu publicado no sítio da internet SOCIAL EUROPE, fui ler o que se diz no CETA sobre Investimentos. O assunto é tratado no Capítulo 8 e vou referir-me apenas ao que mais me saltou à vista, sem pretender escabichar pormenores jurídicos
O dito Capítulo 8 mais parece um manual de protecção dos investidores dum dos espaços económicos no outro, sobretudo das empresas multinacionais, das eventuais “arbitrariedades” do governo do país onde vão investir. Como se os investidores privados fossem sempre pessoas de bem e os estados democráticos onde aqueles vão investir fossem pessoas de duvidoso comportamento. Claro que há multinacionais de procedimentos irrepreensíveis e também há governos democráticos que por vezes têm deslises. O que eu quero sublinhar é que não há no articulado do referido capítulo nenhuma referência a faltas de cumprimento de obrigações assumidas pelos investidores, nomeadamente quanto ao valor real do investimento, à criação de postos de trabalho, à duração da actividade no país, à devolução de benefícios recebidos em troca de promessas não cumpridas, etc. E sabemos que isto acontece.
Outro ponto que quero referir é o da resolução de disputas. Está prevista a criação de 2 tribunais, um de 1ª instância e um de Apelo. Para a 1ª instância haverá 5 juristas escolhidos pela EU, 5 juristas escolhidos pelo Canadá e 5 de países terceiros                       ( escolhidos como e de que países ?  Não está dito ). Cada caso será julgado por 3 juízes, 1 de cada grupo. Os juízes do Tribunal de Apelo serão nomeados pelo Comité Conjunto dos 2 Signatários do Acordo. O que a mim me parece extraordinário é que fique estabelecido que só os investidores podem recorrer ao Tribunal de 1ª instância. Os estados não !. Então que deve fazer um estado que se sente prejudicado por um investidor ?  Agradecer atento e venerador e pedir mais ?
Adiante, o texto determina que os Signatários do CETA devem procurar estabelecer um Tribunal Multilateral  com outros países, parceiros comerciais, para resolução disputas sobre investimento e, logo que aquele entre em funcionamento, os tribunais do CETA serão postos de parte. Será isto bom para todos os países da EU, ou ficarão os mais fracos economicamente sujeitos a decisões de pessoas com outras culturas de negócios ?
Também devo referir um aspecto que considero positivo : No sub-parágrafos 8.9.1 e 8.9.2 fica definido que os estados continuam a ter o direito  de regulamentar as suas políticas relativas à protecção da saúde pública, segurança, ambiente, moral pública, protecção dos consumidores e promoção e protecção da diversidade cultural, mesmo que isso represente perda de lucros ou benefícios para o investidor.
Estes meus comentários são muito simples, destinam-se principalmente a agitar um pouco o assunto CETA e a  procurar despertar a atenção para a necessidade da sua discussão. O meu receio é que já seja tarde e que se a Assembleia da República não ratificar o Acordo, Portugal vá para o “quarto escuro “.
Lisboa, 3 de Novembro de 2016


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