segunda-feira, 8 de maio de 2017

QUEM COM OURO MATA...


QUEM COM OURO MATA …

Gosto de ler os livros policiais de Steven Saylor. Abrangem o tempo de vida do detective, dito « O Descobridor », são passados no mundo romano, na época anterior à era de Cristo. A história dum deles, « A Ira das Furias », tem lugar em 88 AC, no tempo em que Mitrídates Rei do Ponto ( o Ponto era um território ao sul do Mar Negro no que é hoje a Turquia e o rei é um personagem histórico que serviu de tema a uma ópera de Mozart e a uma peça de Racine ) atacava o domínio romano na Ásia Menor.                                                                                                                                                    Entre as inúmeras peripécias, é narrado um castigo aplicado pelo Rei do Ponto a um general romano vencido e capturado e que foi acusado de corrupção, assassínios e  ganância. O castigo, uma pena capital, foi  aplicado da seguinte maneira : depois de enxovalhado das mais humilhantes formas, o condenado foi atado de pés e mãos, meio deitado, sobre uma grade ; o carrasco enfiou-lhe um grande funil na boca e através dele despejou-lhe no interior do corpo uma massa de ouro líquido, obtida por fusão dum  monte de moedas de ouro! A descrição diz que que o desgraçado se contorceu todo em agonia antes de falecer, enquanto o público assistente uivava, gritava gania selvaticamente de satisfação !

Seria este castigo - que francamente não sei se foi autêntico se fruto da imaginação do autor do livro, embora não me custe aceitar que possa ter acontecido -  indigno da humanidade?  Pelos padrões actuais de fazer justiça, sim, ainda que por esse mundo fora se executem ou torturem prisioneiros das formas mais horrorosas – embora não com moedas de ouro fundidas.

E se este castigo ainda fosse aplicável nos dias de hoje  ( usando a lei de talião : quem com ferro, ou ouro, mata, pelo ferro, ou ouro, deve morrer ), seria um dissuasor absoluto contra banqueiros desonestos e políticos corruptos ? Acho que não, pois a ganância é, para muitos, um motivador irresistível. Eles pensam sempre que nunca serão descobertos pois acham que são mais espertos  que os outros.                                                                                                                                                    Tal como a pena de cortar as mãos aos ladrões não impediu os roubos e a pena de morte não impediu, ou impede,  os assassínios

Lisboa, 8 de Maio de 2017

sexta-feira, 5 de maio de 2017

EM LOUVOR DA ASMECL


EM LOUVOR DA ASMECL 

No dia 21 de Abril de 2017, durante uma sessão solene comemorativa do 145º  aniversário da ASMECL- Associação de Socorros Mútuos de Empregados no Comércio de Lisboa, fui homenageado pelos meus 75 de associado. Comigo foram homenageados 37 sócios com 50 anos de antiguidade e 7 colaboradores com longos anos de actividade ao serviço da instituição.

É verdade, fez 75 anos que o meu Pai me inscreveu como Sócio Familiar. Em boa hora o fez, pois de todas as vezes que recorri aos serviços clínicos da ASMECL fui sempre muito bem tratado e com bons resultados.

Algumas recordações

 1. Consulta de pediatria na infância .                                                                                               Tenho a vaga lembrança de o médico ter sido o Dr. Marques Pinto e a consulta ter tido lugar no corpo principal do Palácio de S. Cristóvão, mas certezas não tenho

2. Tratamento dum dente.

Já no tempo do liceu, o Passos Manuel ficava e fica relativamente perto, lembro-me de ter tido necessidade de tratar um dente que estava furado e me doía. O médico achou que valia a pena obturá-lo e preparou-o (desvitalização do nervo penso eu agora ) ao longo de várias sessões de trabalho. No dia marcado para o finalmente, lá me sentei na cadeira ( o que me causava sempre um certo receio ), o médico preparou o material para a obturação, ou seja, fundiu um pouco de chumbo num pequeno cadinho e depois despejou a massa fundida no buraco a tapar. Era o que na altura se chamava « chumbar um dente » ! Não me doeu nada e o chumbo permaneceu no seu lugar penso que duas décadas. Depois caíu e o dentista a que recorri fez a obturação com um material moderno.

3. Ortopedia : reparação do fémur esquerdo.

 Num dos primeiros meses de 1976 fui atropelado, ao atravessar uma rua sem olhar para os lados, em Xabregas. Com o embate, fui projectado para o ar, bati com a cabeça no para-brisas do carro atropelante e caí no chão. Antes de desmaiar ainda tive tempo para dizer o número de telefone de minha casa e pedir para darem a notícia com cuidado à minha Mulher. Acordei no hospital de S. José, já limpo do sangue que tinha brotado da cabeça e com a perna esquerda imobilizada. Tenho a vaga lembrança de que a Miló já estava à minha beira, embora permanecesse numa enfermaria. Não me lembro quanto tempo passou até que a Miló me disse que me ia levar para a Associação. Não me opus, nem certamente estava em condições de o fazer, e ela depois explicou-me que o médico de S. José lhe tinha dito que eu precisava de ser operado para unir as duas partes do fémur partido, que seria necessário um elemento metálico ( um « ferrinho » ) para fazer a ligação e que o hospital não tinha de momento nenhum disponível ! Que teria de esperar que um “ferrinho” fosse retirado dum paciente que já não precisasse dele para me poder ser aplicado. Que não havia previsão de tempo para o efeito e que, se ela tivesse alguma clínica para onde me levar, seria o mais acertado. E assim fui para a Associação.

 Uma vez aí, fui entregue aos cuidados do Dr. Carlos Ribeiro – um grande médico ortopedista e operador a quem presto mais uma vez a minha homenagem, e que morreu prematuramente num desastre de automóvel – que me operou numa terça-feira. Depois da operação, ele disse à Miló  que eu ia ter dores fortes durante 24 h e que receitava umas pastilhas para aliviar. De facto, passado o efeito da anestesia tive dores tremendas que, como ele previu, duraram quase exactamente 24h. Com a ajuda do « ferrinho » e dum « ferro », um perfil metálico que o médico colocou paralelamente ao fémur para dar resistência, ao fim de algumas semanas pude voltar ao trabalho. O “ferro” foi retirado passado um ano por meio duma intervenção simples. O “ferrinho” ainda cá está

O resultado da operação foi óptimo pois passado pouco tempo pude recomeçar a fazer desporto ( coisa que ainda faço ) e ao longo dos anos nunca me doeu nada, nem senti as mudanças de temperatura ou humidade

E sabem quanto me custaram os serviços prestados pela ASMECL ? Apenas o custo de ter estado num quarto individual . Nada mais !  E estes benefícios eram dados por uma instituição mutualista que vivia apenas das quotizações e donativos dos sócios. Muito melhor que o que qualquer companhia de seguros oferecia aos seus clientes ! Infelizmente, a ASMECL hoje já não funciona assim : na vida nem tudo tem evoluído para melhor.

Na minha opinião, o mutualismo e o cooperativismo são das mais notáveis maneiras de nos ajudarmos uns aos outros e de resolvermos os nossos problemas

Outras ( boas ) recordações

Foi na maternidade da Associação que nasceram os meus 2 filhos, ambos por cesariana, e duas das minhas netas, por parto normal

Uma reflexão que faço ainda sobre o que se passou e foi relatado em 3)do  )                                     Que fazia eu em Xabregas, num dia de semana, quando era suposto estar a trabalhar?  Resposta : ia ao cais levantar o meu carro e alguns pertences que tinham regressado do Lobito ( Angola ), via Inglaterra !

De facto, quando, em Setembro de 1975, a direcção da Empal onde eu era o gerente fabril e co-responsável, decidiu suspender temporariamente o funcionamento da fábrica, até passarem os tumultos pré-independência de Angola ( que iria ter lugar em Novembro ) e proceder ao repatriamento de pessoas e bens para Portugal, o meu carro pessoal, não o de serviço, foi embarcado num cargueiro com destino a um porto inglês. Aí, os serviços da Unilever ( a multi-nacional dona em conjunto com a firma Jerónimo Martins, Lda  da Fima- Empal ) se encarregariam de o remeter para Portugal. Esta operação demorou vários meses e só no princípio de 1976 o carro chegou a Lisboa.  E eu fui avisado para o ir buscar                                                                                                       Digamos que o meu atropelamento foi o ponto final das minhas estadias em Angola, de 1963 a 1965 durante a guerra colonial e em 1975, na minha « comissão civil » ao serviço da Fima-Empal. Em ambos os casos, corri perigos, ouvi tiros e não me sucedeu nada ! Nem sequer estive doente .             E foi em Xabregas que o destinou me pregou uma partida, quase me deixando morrer ingloriamente no asfalto duma rua de Xabregas

F . Fonseca Santos

Lisboa, 5 de Maio de 2017