sexta-feira, 29 de maio de 2020
A CRISE FINANCEIRA INTERNACIONAL DE 2009 E O SEU REFLEXO EM PORTUGAL : CAUSAS , CONSEQUÊNCIAS E IDEIAS ERRADAS PARTE I – CAUSAS e DUAS IDEIAS ERRADAS
A ) Relembrando o que se passou :
Em resultado da falência da banco norte americano Lehman Brothers em 2008 ( crise dos sub-prime desencadeada nos EUA) estabeleceu-se grande confusão e desconfiança nos mercados financeiros e os bancos deixaram de emprestar dinheiro. Sem crédito, a actividade económica paralisou e a economia entrou em recessão. Numa 1º fase, que durou pouco, a União Europeia aconselhou os governos a aumentarem a despesas pública a fim de combater a recessão, mas rapidamente mudou de opinião em 180º passando a aconselhar máxima redução de despesas. Países como Portugal viram as falências de empresa crescerem, o desemprego aumentar e as receitas fiscais diminuírem. Como o Estado, desde há décadas ( ver anexos ) já dependia de empréstimos para satisfazer os seus compromissos, o aumento de desequilíbrio entre receitas e despesas, fez aumentar a necessidade daqueles. E como a desconfiança dos investidores financeiros era grande, como acima ficou dito, estes começaram a pedir juros, exorbitantes, incomportáveis para quem pedia emprestado ( foi a crise das dívidas soberanas)
O Banco Central Europeu não comprou dívida pública dos países necessitados em quantidade suficiente ( como fez mais tarde Mario Draghi e recentemente Christine Lagarde ) e Portugal em desespero de causa, em situação de quase bancarrota, através do Governo de José Sócrates com a concordância dos partidos da direita, teve de recorrer à União Europeia e ao FMI para obter dinheiro mais barato. O empréstimo teve de obedecer às regras dos emprestadores ( a chamada troika ), as quais foram postas em prática pelo governo que se seguiu ao de José Sócrates, a coligação PSD+CDS ( Passos Coelho + Paulo Portas ).
B ) Analisemos agora 2 ideias erradas que na altura tentaram e ainda tentam impingir à generalidade da população :
1) É verdade que a culpa da quase bancarrota do país foi o despesismo do Governo Sócrates e dos governos socialistas em geral ?
NÃO !
Basta olhar para o QUADRO Anexo 1 , onde figuram valores tirados dum comunicado da Agência Lusa de 20/3/2008, e para o QUADRO Anexo 2 , onde se reproduzem dados tirados da PORDATA sobre défice e dívida a partir de 1995 para se observar que todos os governos pós Revolução de 25 de Abril de 1974 apresentaram défices nas contas publicas e contraíram empréstimos e que OS DÉFICES MAIS BAIXOS SE VERIFICARAM COM GOVERNOS SOCIALISTAS.
Quanto ao défice de 9,9 % do PIB que ocorreu em 2009 com o Governo de José Sócrates, ele foi resultante das consequências da crise financeira internacional acima descritas. De facto o Governo Sócrates podia ter gasto menos dinheiro, se tivesse deixado de pagar subsídios de desemprego, rendimentos sociais de inserção, complementos sociais par idosos e outras prestações sociais. Mas essa solução teria sido a correcta ? Não me parece, nem a ninguém com um mínimo de sentimentos de solidariedade social. Para melhor compreensão, ver o QUADRO Anexo 3 que compara as Contas da Administração Pública de 2008 com 2009 e reparar onde houve aumento de despesa e diminuição de receita
No ano de 2010, houve 2 governos, inicialmente de José Sócrates e depois de Passos Coelho. Pelas razões anteriormente avançadas o défice foi de 11,4 % do PIB. Ver Quadro Anexo 4.
Confirma-se portanto que os governos do Partido Socialista não foram despesistas.
2) ´E verdade que o Governo de Passos Coelho e Paulo Portas salvou o País ?
Não !
Como vimos, o problema do País, resultante da crise financeira internacional, foi o de não conseguir obter empréstimos a juros razoáveis. Ora este objectivo não foi conseguido pelo Governo PSD+CDS, foi resultado dum pedido de auxílio à União Europeia feito Governo de José Sócrates, aprovado por aquela, com a imposição de condições económicas prejudiciais para Portugal ( como a privatização de empresas públicas rentáveis ).
O Governo Passos Coelho e Paulo Portas foi apenas o executante dum guião escrito pela troika, baseado em ideias de economia neo liberal .
Portanto quem salvou o País foram a UE e o FMI.
Mas nunca é demais reafirmar que se o Banco Central Europeu, sob a orientação do Sr. Trichet, tivesse tomado a atitude que mais tarde, sob a direcção do Sr. Mario Draghi, tomou, tudo teria sido diferente.
Os resultados para a população portuguesa da dita “salvação “ serão resumidos na PARTE II deste artigo, a partir do excelente estudo “ DESIGUALDADE DE RENDIMENTOS E POBREZA EM PORTUGAL – As consequências sociais do programa de ajustamento “ , da autoria de Carlos Farinha Rodrigues et al , do Instituto Superior de Economia e Gestão, edição de 2016 da PORDATA
Lisboa, 29 de Maio de 2020
PORTUGAL - CONTAS PÚBLICAS QUADRO 1
ANO DÉFICE DÍVIDA PÚBLICA Governos
em % PIB em % PIB em M Escud
1974 62.809 Gov Provisório
1975 100.340 Gov Provisório
1976 151.379 Gov M Soares
1977 -2,9 210.549 Gov M Soares
1978 -7,2 292.530 Soares et al
1979 -5,1 253.773 Gov Pinto e MLPintasilgo
1980 -7,2 466.918 Gov Sá Carneiro
1981 -8,7 709.702 Gov Balsemão
1982 -7,2 938.834 Gov Balsemão
1983 -5,1 1.302.540 Balsemão e Bloco Central
1984 -5,5 1.773.625 Bloco Central
1985 -8,6 2.343.372 Bloco Central
1986 -7,5 2.858.292 Gov Cavaco
1987 -5,9 3,768.076 Gov Cavaco
1988 -3,6 4.511.583 Gov Cavaco
1989 -2,9 5.180.194 Gov Cavaco
1990 -6,3 5.671.315 Gov Cavaco
1991 -7,6 6.584.002 Gov Cavaco
1992 -4,7 7.048.897 Gov Cavaco
1993 -8,1 8.225.777 Gov Cavaco
1994 -7,7 9.328.602 Gov Cavaco
1995 -5,5 10.509.910 Gov Guterres
1996 -4,8 11.161.220 Gov.Guterres
1997 -4,0 11.365.911 Gov.Guterres
1998 -3,2 11.677.376 Gov.Guterres
Os valores do défice foram tirados dum comunicado
da Agência Lusa de 20 de Março de 2008
Os valores da dívida foram tirados do livro
PORTUGUESE HISTORICAL STATISTICS , ED. INE
PORTUGAL - CONTAS PÚBLICAS QUADRO 2
ANO DÉFICE DÍVIDA SOBERANA OBS.
m % PIB em % PIB em M de €
1995 -5,2 61,6 54.874,0 Gov Guterres
1996 -4,7 63,1 59.561,0 Gov Guterres
1997 -3,7 58,6 59.928,0 Gov Guterres
1998 -4,4 55,0 61,249,0 Gov Guterres
1999 -3,0 54,8 65.550,0 Gov Guterres
2000 -3,2 54,2 69.592,0 Gov Guterres
2001 -4,8 57,4 77.908,0 Gov Guterres
2002 -3,3 60 85.595,0 Gut e Barroso
2003 -5,7 63,9 93.333,0 Gov Barroso
2004 -6,2 67,1 102.158,0 Barr. e depois Santana Lopes
2005 -6,1 72,2 114.553,0 S.L. e depois Sócrates
2006 -4,2 73,7 122.500,0 Gov Sócrates
2007 -2,9 72,7 127.626,0 Gov Sócrates
2008 -3,7 75,6 135.478,0 Gov Sócrates
2009 -9,9 87,8 154.014,0 Gov Sócrates
2010 -11,4 100,2 179.966,0 Gov Socr. e depois Passos
2011 -7,7 114,2 201.459,0 Gov Passos
2012 -6,2 129,0 217.160,0 Gov Passos
2013 -5,1 131,4 224.078,0 Gov Passos
2014 -7,4 132,9 230.059,0 Gov Passos
2015 -4,4 131,2 235.746,1 Gov Passos
2016 -1,9 131,5 245.244,8 Gov A Costa
2017 -3,0 126,1 247.173,7 Gov A Costa
2018 -0,4 122,0 249.260,8 Gov A Costa
2019 0 117,7 249.980,3 Gov A Costa
NÚMEROS TIRADOS DA PORDATA
QUADRO ANEXO 3
CONTAS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DE 2008 e 2009
QUADRO ANEXO 4
CONTAS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DE 2010
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