A PROPÓSITO DUM VETO DO PR
O ACONTECIMENTO : O Presidente da República, Sr.
Marcelo Rebelo de Sousa, vetou um diploma aprovado na Assembleia da República
pelos partidos de esquerda que pretendia tornar irreversível a municipalização
da Companhia dos Carris de Ferro de Lisboa.
Claro que a
lei votada no Parlamento não tornaria impossível a privatização da Carris (
bastaria que, num futuro que se deseja o
mais longínquo possível, uma outra
maioria parlamentar revertesse o diploma ) e portanto não se compreende bem o
interesse do PCP em introduzir a alteração ao texto inicial do decreto do
Governo que motivou o veto do PR.
Segundo a
comunicação social, o PR vetou a parte do diploma que “impõe ao governo e às
autarquias locais um regime que proíbe qualquer concessão da Carris mesmo que
tal possa vir um dia a corresponder à vontade da autarquia, o que representa
uma excessiva intervenção da Assembleia numa decisão que cabe ao poder local”.
Isto é
verdade, os autarcas eleitos devem poder decidir se querem ou não gerir os
transportes públicos da sua localidade.
Por exemplo,
no caso de Lisboa, os presentes autarcas não querem gerir o Metropolitano,
embora queiram ter uma palavra a dizer no seu funcionamento.
Portanto é
muito importante que um governo
municipal lisboeta, duma linha de pensamento diferente da do actual, que queira
privatizar a gestão da Carris NÃO O POSSA FAZER POR UM PERIODO SUPERIOR ÀQUELE
PARA O QUAL FOI ELEITO.
Porquê ?
Porque de outra maneira estaria a impedir o executivo camarário seguinte de
voltar a tomar posse da Carris, se assim o desejasse !
Esta
orientação sobre o funcionamento da democracia deveria ter sido seguida, p.
ex., quando foi da privatização da ANA, concessionada por um período de 50 anos
(!), cuja vantagem a médio e a longo prazo para Portugal é, na minha opinião,
NULA ou NEGATIVA.
Desenvolvendo
esta ideia, como os povos, tal como as pessoas, mudam ou podem mudar de ideias por
razões válidas e, em consequência, num regime democrático onde haverá
fatalmente alternância de ideologias ou de pragmatismos no poder, nenhum novo
governo deve ficar de mãos atadas por decisões tomadas pelo anterior. Esta
possibilidade existe em muitos domínios importantes da vida colectiva : na
educação cada governo pode mudar as matérias, os exames, os cursos, conforme
achar melhor ; nas finanças, o peso dos impostos pode ser mudado para
beneficiar os mais ricos ou os mais pobres, as empresas ou os cidadãos; etc.
Na concessão
de serviços públicos a entidades privadas, os contratos nunca deveriam ser
leoninos a favor daquelas ( como se
lê frequentemente a propósito das PPPs,
do SIRESP, da ANA ) mas conter cláusulas que, sem pôr em causa o dinheiro
investido e ainda não recuperado pelos privados permitisse ao Estado resolver o
contrato sem despesas indevidas, incluindo a parcela correspondente à não
realização de lucros previstos para os anos seguintes E a existência de
cláusulas secretas deveria ser absolutamente proibida, acarretando de imediato
a anulação do contrato e a responsabilização criminal dos autores.
P.S. Este
raciocínio não se aplica ao pagamento das dívidas contraídas pelo Estado
Português, mas pode aplicar-se aos juros contratados no que respeita à discussão
do seu valor
Lisboa, 14 de
Agosto de 2017