segunda-feira, 23 de novembro de 2020

PANDEMIA E ORÇAMENTO DE ESTADO PARA 2021

Os Portugueses têm obrigação de mostrar a sua solidariedade humana para os que sofrem, física ou economicamente, com a pandemia do Covid 19 auxiliando-os através do OE suplementar para 2020 e através do OE para 2021, este em discussão na Assembleia da República. E não tenho dúvidas que esse auxílio deve contemplar também aqueles que quando ganharam dinheiro não descontaram para a Segurança Social, aqueles que não tendo tido, deliberadamente, o cuidado de seguir as regras da DGS foram infectados, aqueles que nos suas vendas se “esqueceram” de registar a respectiva factura, ficando isentos do pagamento do imposto correspondente – com a esperança de que no futuro a gratidão para com os seus compatriotas os conduza a comportamentos diferentes. É preciso dar para receber e é preciso receber para dar. O OE2021 tem pois que atender às despesas resultantes do normal funcionamento do Estado e às despesas extraordinárias resultantes da pandemia. Para isso o País vai ter de contrair mais dívida pois o dinheiro resultante da cobrança de impostos e das verbas disponibilizadas a fundo perdido pela União Europeia não vão ser suficientes. Sabendo-se que a dívida pública portuguesa é já extraordinariamente elevada, o seu aumento deve ser o estrictamente necessário. Porque, mais tarde ou mais cedo, a dívida vai ter de ser paga. E enquanto não for saldada há juros a pagar e mais dívida a contrair quando o prazo de pagamento duma parte dela chegar ao fim e não houver dinheiro disponível para a liquidar. Uma dívida soberana como a nossa, à volta de 130% do PIB quantos anos, melhor dito, quantas décadas, vai levar a resolver? De momento, devido à acção do Banco Central Europeu e ao excesso de dinheiro existente no mercado financeiro os juros são baixos e alguns dizem não haver perigo em pedir dinheiro emprestado, mas, e daqui a 5 anos, daqui a 10 anos, como como será? Esses, os que assim pensam, julgarão que, na realidade, Pluto o deus do dinheiro da mitologia grega existe e vai derramar a sua cornucópia sobre Portugal? Ou julgarão que as instituições prestamistas, num insólito acto de boa vontade ou de misericórdia, nos vão perdoar as dívidas? Repito o que já disse noutras ocasiões: os países, como as pessoas, para serem respeitáveis e respeitados têm obrigação de pagar as suas dívidas. Na discussão dos beneficiários a auxiliar e dos quantitativos envolvidos nesse auxílio existe, na discussão do OE2021, a habitual dicotomia entre esquerda e direita. Os partidos à esquerda do PS querem mais ou muito mais para as pessoas e os da direita, mais ou muito mais para as empresas. O Governo fez a sua proposta, com os elementos de que dispõe e com as cautelas que as considerações acima escritas sobre a dívida soberana impõem, não se tendo esquecido que sem empresas não há empregos (excepto nos serviços públicos) e que, com muita gente no desemprego ou com fraco poder de compra, a procura interna seria muito reduzida e as empresas veriam o seu volume de negócios francamente diminuído ou iriam mesmo para a falência. A atitude da direita de querer mais para as empresas do que para as pessoas está em linha com as suas ideologias, mas querer aumentar ainda mais a dívida pública é aparentemente contraditório com a sua atitude habitual. A não ser que queiram deliberadamente um orçamento que possa ser considerado despesista para um dia mais tarde, quando chegar a hora de pagar a conta, acusarem o Governo PS de ser despesista! Será esta a estratégia política em curso? Ou terão perdido a esperança de ser governo nos anos vindouros? A verba para o SNS em 2021 é também motivo de grande discussão. Na minha opinião a verba deve ser constituída por duas parcelas: a verba para o funcionamento do SNS em situação normal e a verba para ocorrer ao aumento de despesa devido à pandemia. A primeira deve contemplar a melhoria constante dos serviços , sem tentar, porem, resolver todas as dificuldades num ano só e atender à inelutabilidade de se voltar ao equilíbrio orçamental quando a crise for considerada ultrapassada. A segunda parcela da verba deverá ser transitória. AS propostas do BE sobre leis de Trabalho não têm cabimento na discussão dum OE pois não têm influencia neste. Não devem ser usadas como moeda de troca para outras aprovações. Mas devem ser discutidas na Concertação Social e depois no Parlamento. Como escrevi num artigo em 20 de Março de 2018, não é aceitável que “ as indemnizações (por despedimento) no tempo do Sr. Marcelo Caetano fossem mais generosas (para os trabalhadores) do que são nos contratos de trabalho celebrados a partir de 1/10/2013 ( Governo do Sr. Passos Coelho + troika)”.

quarta-feira, 14 de outubro de 2020

O MURO DAS LAMENTAÇÕES

O MURO DAS LAMENTAÇÕES A 12 de Outubro de 2020 o Orçamento de Estado para 2021 foi entregue no Parlamento e A 21 de Outubro o Ministro das Finanças deu uma conferência de imprensa para realçar alguns detalhes daquele e responder a perguntas dos jornalistas. Logo de seguida, as televisões transmitiram comentários dos partidos políticos, sindicatos, associações patronais, etc. E aí cheguei à conclusão que não tinha apresentado um orçamento mas um Muro das Lamentações ! Quase nenhum sector da sociedade portuguesa deixou de ser contemplado com algum benefício, absolutamente necessário em face das crises económica e social causadas pela doença pandémica Covid 19. Mas apesar do enorme sacrifício que isso representa em aumento de dívida pública – que um dia os portugueses terão da pagar – ninguém, excepto provavelmente os apoiantes do Governo, se mostrou satisfeito. Todos queriam mais para o grupo que representam ou dizem representar, como se fosse possível ao Governo distribuir dinheiro a rodos sem pensar no futuro. Pessoalmente acredito que o Orçamento contempla as necessidades imediatas da população, sobretudo dos mais prejudicados pela recessão económica e procura criar condições para a continuação da luta contra a doença e para que as empresas afectadas pela crise possam sobreviver. Reprovar o Orçamento na Assembleia da República teria como consequência a despesa do Estado passar a ser gerida pelo regime de duodécimos, com base no Orçamento anterior, sem as melhorias para todos que a proposta apresentada traz. Se os partidos políticos acham que a solução dos duodécimos é melhor que a proposta, então realmente devem votar contra. Mas isso será falta de pragmatismo ou ideologia política levada ao absurdo? Lisboa, 14 de Outubro de 2020 Post Scriptum : O que escrevi não significa que que concorde com as desigualdades exageradas que existem na sociedade portuguesa : há muito a fazer neste campo. Mas apesar de tudo o Orçamento em causa dá um pequeno contributo para a redução daquelas. Não seria possível num único ano resolver todos os problemas, mas deveria ser estabelecido um plano pluri-anual resolver o problema social e civilizacional que isso representa.

segunda-feira, 7 de setembro de 2020

A DIRECÇÃO GERAL DE SAÚDE, OS CRÍTICOS E A FESTA DO AVANTE

Uma coisa é certa : os anos que tenho para viver são muito menos do que aqueles que já vivi. Mas existem coisas que gostaria de fazer e que a pandemia veio adiar, ainda não sei para quando. Por isso ouço e leio com muito interesse as notícias que vão surgindo sobre a evolução da doença, os novos conhecimentos que vão surgindo, as vacinas e os tratamentos em investigação - sempre na esperança de ficar a saber que os perigos da pandemia vão ser afastados. Uma das minhas fontes informativas, desde o principio, assistindo em directo ou em diferido, são as conferências de imprensa do Ministério da Saúde / Direcção Geral de Saúde (DGS ), onde é feito o ponto da situação diária e são dadas respostas às questões postas pelos jornalistas. Tive, e tenho, sempre a noção de que as informações e as respostas eram, são, dadas com toda a honestidade e vontade de esclarecer as pessoas e nunca notei qualquer desejo de evitar um assunto ou tentativa de ocultação de factos. Tive sempre a sensação de estar perante pessoas de confiança. Uma ou outra vez as orientações expressas foram alteradas, mas considero que isso é sinal de inteligência – na medida em que inteligência á a capacidade de se enfrentar situações novas, um atributo dos humanos. A maneira como deve ser enfrentada a pandemia e os cuidados a ter diferem, quer nas decisões das autoridades dum país ( variando entre posições extremas como a Suécia e a China ) quer nas opiniões de especialistas, de pessoas que emitem opiniões na comunicação social ou simplesmente de populares. A mim, opinião de popular, parece-me que as directivas emanadas pela DGS são sensatas, baseadas nos conhecimentos científicos disponíveis, não variando conforme diga respeito à situação ou ao acontecimento A, B ou C e procurando manter o equilíbrio possível entre a precaução e a necessidade de continuarmos as actividades sociais, profissionais e lúdicas. Em resultado da diferença de opiniões acima falada, a DGS tem sido atacada, por vezes de forma civilizada, no campo das ideias, por vezes de forma sectariamente violenta e injusta ( *), por vezes por fazer de mais, por vezes por fazer de menos. E o Governo, na sua obrigação de promover o bem comum, toma as suas decisões em conformidade com as informações técnicas que lhe são fornecidas, transformando-as em decisões políticas com força de lei. Há quem não goste e barafuste, nada de anormal : é o sistema democrático a funcionar. Mas a legislação é para ser cumprida, não pode ficar ao livre arbítrio de cada um fazer o que apetece, quando não concorda. O caso da festa do Avante é um caso típico de mistura de preocupações de saúde publica com luta política. Os adversários políticos do PCP estiveram visceralmente contra a realização festa, alegadamente por razões sanitárias, mas na realidade porque são contra o PCP e para DAevitar uma acção de propaganda política em grande escala, chegando a insinuar que o Governo nã proibiu a festa para tentar conquistar o PCP relativamente à aprovação do orçamento para 2021 ( omo se o PCO se deixasse convencer por esse processo ). Fizeram de conta que ignoravam que, fora do estado de emergência, não é possível a um Governo proibir manifestações politicas. Mas, muitas pessoas genuinamente preocupadas com o controlo da pandemia, também pensaram que o Governo deveria proibir a festa por motivos de saúde pública, para evitar contágios, mesmo que a organização prometesse cumprir as determinações da DGS. De facto, mesmo cumprindo à risca todas as regras, não haveria risco zero, como não há risco zero nos transportes públicos, nos empregos, nos espectáculos autorizados, nas reuniões familiares, na feira do livro, etc. e como não vai haver no regresso às aulas. Devemos ser prudentes e seguir as orientações da DGS, mas não podemos deixar de viver a nossa vida de relação. Tanto quanto me apercebi, a DGS para a festa do Avante não atenuou nem inventou regras : sistematizou para a diversas actividades que iam decorrer o que já estava estabelecido para restaurantes, bares, espectáculos ao ar livre, comícios, etc. E a determinação do número máximo de pessoas obedeceu ao mesmo critério que a lotação das praias. Não me parece que tenha havido incoerências. Mas dito isto, também têm razão aqueles que perguntam: Desde o início da pandemia tanta gente abdicou de tanta coisa, na Páscoa emigrantes não vieram ver as famílias, os outros partidos políticos têm feita a reentrada sem festas populares, continuamos a não fazer tudo o que gostaríamos, porque razão o PCP não se mostrou solidário reduzindo a festa tradicional à parte política? (+ ) Um caso típico é o que o Sr. Director do semanário Expresso disse no artigo que publicou na página 2 do número de 5/9/2020 Lisboa, 6 de Setembro de 2020

quinta-feira, 9 de julho de 2020

A NACIONALIZAÇÃO DA EFACEC

No seu campo de actividade, a engenharia electrotécnica, a EFACEC é uma empresa de prestígio mundial, com conhecimentos técnicos ( know how ) próprios, companhias na Europa, nas Américas e na Ásia, que vence concursos internacionais e exporta produtos de alto valor acrescentado. É portanto uma empresa cujo desaparecimento depauperaria o já de si não muito rico, tecido industrial português e privaria o país dum exportador de qualidade. Portanto, fez muito bem o Governo em deitar mão à empresa, nacionalizando-a, garantindo a sua sobrevivência financeira e preparando-a para ser vendida quando aparecer um comprador conveniente. Um “comprador conveniente”. A escolha do adquirente não me parece uma tarefa simples, nem pode ser baseada unicamente no “quem dá mais”. Em meu entender, deverá ser uma firma com interesses indiscutíveis na industria, de sólida base financeira, de preferência de capitais nacionais e que ofereça garantias de não vá “parti-la aos bocados” e vender estes de forma a obter um lucro fácil. Aceitar como comprador uma companhia financeira, um fundo investimentos por exemplo, é um risco grande pois estas entidades não têm verdadeiramente gosto pela indústria, pela agricultura, pelos serviços, etc,: só têm gosto pelo dinheiro em si. Quando vêm possibilidade de fazer um bom negócio, depois de terem extraírem tudo o que puderam, vendem, sem lhes interessar o futuro da empresa. O Governo deve acautelar este risco e não pode ter pressa em vender pois, como disse acima, a EFACEC é uma empresa valiosa cuja continuidade interessa garantir. Lisboa, 9 de Julho de 2020

quarta-feira, 17 de junho de 2020

A CRISE FINANCEIRA INTERNACIONAL DE 2009 E O SEU REFLEXO EM PORTUGAL :

PARTE II – CONSEQUÊNCIAS Como deixei escrito no final da PARTE I, os resultados para a população portuguesa do programa da troika, executado pelo Governo PSD+CDS, serão resumidos nesta PARTE II do artigo, a partir do excelente estudo “ DESIGUALDADE DE RENDIMENTOS E POBREZA EM PORTUGAL – As consequências sociais do programa de ajustamento “ , da autoria de Carlos Farinha Rodrigue et al. , do Instituto Superior de Economia e Gestão, edição de 2016 da PORDATA, daqui em diante referido simplesmente como ESTUDO. 1. A redução dos rendimentos Observando o Quadro 1, pág.26 do ESTUDO que apresenta as perdas de rendimento dos vários decis hda população entre 2009 e 2014 , vê-se que os rendimentos familiares equivalente das famílias mais pobres sofreram muito mais que os das famílias mais ricas no período 2009-2014 : enquanto os dois primeiros decis tiveram uma redução, respectivamente de 25% e 16% , para o último a redução foi de 13%, sendo a redução média considerando todos os decis de 12 % ( Nota : O 1º decil diz respeito aos 10% da população com rendimentos mais baixos, o 2ª decil aos 10 % da população com rendimentos a seguir aos mais baixos e assim sucessivamente até ao 10º decil onde estão os 10% da população com os rendimentos mais altos ) No que respeita aos outros países sujeitos ao ajustamento em comparação com a média da União Europeia no Gráfico 5 ( pág. 31 da mesma fonte ), vê-se que em resultado da crise os países sujeitos ao torniquete da troika, particularmente a Grécia, viram os rendimentos familiares diminuírem, enquanto que na União Europeia a 28, ou a 17 subiram. CONCLUSÕES DESTE PONTO : i) Devido às políticas implementadas durante o tempo da toika, em média toda a população sofreu cortes no seu rendimento, mas os mais pobres francamente mais que os mais ricos. ii) Na EU, os países que tiveram necessidade de auxílio perderam rendimentos, enquanto que os restantes países ganharam rendimentos 2. Aumento das desigualdades A evolução da desigualdade é medida pela variação ao longo dos anos de indicadores como o Índice de Gini, os Índices de Atkinson e a relações entre os rendimentos médios dos decis mais elevados e os dos mais baixos No ESTUDO, os números apresentados mostram que, se as desigualdades económicas diminuíram de 2006 a 2009, no intervalo de 2009 a 2014 aumentaram ( Quadro 4 da pág. 38 ) A relação entre o rendimentos médios do decil mais rico ( S90 ) e o decil mais pobre ( S10 ) passou de 9,2 em 2009 e para 10,6 em 2014 . E se for considerada a relação entre os rendimentos médios dos 5% mais ricos e os dos 5% mais pobres ( S95/S5 ) o aumento foi de 14,3 em 2009 pata 18,4 em 2014. A comparação entre o que se passou em Portugal e na União Europeia pode ver-se no Gráfico 12, 13, 14 e 15 das pág. 42 e 43 do ESTUDO através da variação do coeficiente de Gini ( Relembrando que o índice de Gini varia entre 0 (igualdade total ) e 1 ( máxima desigualdade ) e portanto quanto maior for o índice, mais desigual é a sociedade) CONCLUSÕES DESTE PONTO : i) As políticas seguidas tornaram a população de Portugal mais desigual em termos de rendimentos ii) No contexto europeu, Portugal manteve-se como um dos países mais desiguais 3. Agravamento da pobreza monetária A taxa de pobreza monetária é definida como a percentagem da população que usufrui menos que 60% do rendimento mediano por adulto equivalente, valor que constitui a linha de pobreza oficial Esta taxa, porem não dá uma medida realista da medição de pobreza ao longo dum período porque, devido a variações do valor da mediana causada por descidas dos rendimentos o valor da mediana pode descer e fazer sair pessoas da zona de pobreza sem que efectivamente tenham saído. Por isso foi criada a noção de “linha de pobreza ancorada num determinado ano” calculada a partir do ano de referência usando o índice de preços no consumidor para o actualizar O Gráfico 21 da pág.52 do ESTUDO mostra como aumentou a taxa de pobreza em Portugal de 2009 a 2014 : a pobreza oficial aumentou de 17,9% para 19,5% e a pobreza ancorada ou referida a 2009 aumentou de 17,9% para 24,2 %. O gráfico 23 da pág. 55 do ESTUDO mostra como taxa de pobreza nos países sujeitos ao ajustamento aumentou mais que na média da UE28 e da Zona Euro. CONCLUSÕES DESTE PONTO : A crise de 2009 aumentou a taxa de pobreza em Portugal e na maior parte dos países da UE 4) Quantos eram os pobres em Portugal Como vem escrito na pág. 85 do estudo, utilizando o conceito de linha de pobreza oficial, os pobres aumentaram em mais de 116.000 pessoas de 2009 para 2014, passando de 1,903 milhões em 2009 para 2,019 milhões em 2014, dos quais 22,2 % eram menores de 17 anos e 17,8 % idosos 5) Aumento da privação material Relembremos as noções de privação material ( PM )e privação material severa (PMS) . Diz-se que uma família ou um indivíduo está em PM se, por motivos financeiros, não com seguir satisfazer 3 destas nove condições : - ter as contas em dia ( não ter atrasos no pagamento de rendas, despesas etc. ): - gozar uma semana de férias fora de casa; - fazer uma refeição de carne, peixe ou equivalente vegetariano pelo menos dia sim, dia não: - conseguir fazer face a uma despesa imprevista sem pedir um empréstimo; - ter telefone - ter televisão a cores ; - ter uma máquina de lavar roupa; - ter automóvel ; - manter a casa aquecida no inverno A PMS verifica-se quando não é possível satisfazer 4 destas condições. Em Portugal, entre 2009 e 2017 ( Quadro 11, pág 60 do ESTUDO ) A PM aumentou de 21,5 % para 25,7 % e A PMS aumentou de 9,1 % para 10,6 % Um outro indicador que permite a avaliar o que se passou nos capítulos da pobreza e da privação material é o da pobreza consistente. . Um pobre consistente é uma pessoa que está simultaneamente em situação de pobreza e de privação material. Este indicador passou de 8,2% da população para 9,7 % em 2014. Comparando com o que se passou na UE a 27 ( UE sem croácia ), observa-se no Gráfico 29 da pág. 63 do ESTUDO que entre 2009 e 2014 a PMS diminuiu em 10 países, permaneceu constante em 2 e aumentou em 15. Em Portugal subiu 1,5% enquanto na média da EU a 27 cresceu 0,7 % CONCLUSÕES DESTE PONTO : A crise de 2009 aumentou a taxa de privação material em Portugal e na maior parte dos países da EU 6) Perda de rendimentos salariais A análise feita no Capítulo 7 do ESTUDO mostra que o ganho médio equivalente mensal dos trabalhadores diminuiu de cerca de 6% entre 2009 e 2014 em termos brutos e cerca de 12,7% em termos líquidos. Considerando os decis daquele ganho médio bruto, verifica-se que os mais penalizados são o 1º , que passou de 515 € para 449 € ( - 14,7% ) e o 10ª que reduziu de 4116 € para 3670 € (- 10,8 % ). E também se verificou que os trabalhadores por conta de outrem com baixos salários ( definem-se baixos salários como salários abaixo de 2/3 da mediana ) passaram de 14,0 % em 2009 para 15,4% e que a respectiva taxa de pobreza aumentou de 6,1% para 8,0% Ou seja, os trabalhadores de mais fracos rendimentos perderam mais que os outros e a correspondente taxa de pobreza aumentou 7) Como se distribuíram as perdas pelos diferentes grupos de trabalhadores O ESTUDO mostra que : - Os trabalhadores mais jovens ( < ou= 24 anos ) perderam mais que os outros grupos etários - O género feminino perdeu mais que o masculino - Os contratados a prazo perderam mais que os permanentes - Os trabalhadores a tempo parcial perderam mais que os a tempo integral - Os trabalhadores com cursos superiores, em percentagem, perderam quase o dobro em comparaçãocom os dos outros graus de ensino - Por sectores de actividade, os trabalhadores da indústria melhoraram enquanto os de todas as outras actividades pioraram. 8) Efeitos das alterações efectuadas nas transferências sociais Entre 2009 e 2014, verificaram-se alterações nas transferências sociais relativas a abono de família (AdF), rendimento social de inserção (RSI) e complemento solidário pata idosos (CSI) 8.1 ) AdF Em 2010, o AdF foi eliminado para as famílias de maiores rendimentos ( 4º e 5º escalões ), bem como a majoração de 25% para o 1º escalão ( famílias de rendimento anual até 2.934,54 € e para o 2º escalão de rendimento anual de 2.934,54 € a 5.869,08 € ). Isto contribuiu certamente para aumentar a pobreza naqueles escalões. 8.2) RSI Como se pode ler na página 134 do ESTUDO, 2 reformas na atribuição do RSI, em 2010 e 2012 reduziram não só o montante a receber por cada beneficiário (foram eliminados alguns benefícios adicionais), como reduziram o número de pessoas elegíveis .No entanto o valor máximo que um indivíduo que viva só foi mantido foi mantido até 2013, quando foi reduzido de 189,52 €/mês para 178,15 €/mês. Isto significou que o número de beneficiários passou de 486.977 em 2009 para 320.811 em 2014 e número de famílias abrangidas foi reduzido de 192.249 em 2009 para 139.557 ( em 2014). Em período de crise, foi um grande contributo para o aumento da pobreza 8.3) CSI O CSI foi criado em 2005 e é igual à diferença entre os recursos do idoso e um valor de referência . Em 2009 aquele era de 5.022 €/ano e foi reduzido em 2013 para 4.909 €/ano . O número de beneficiários subiu de 232.808 em 2009 para 237.845 em 2013 e caiu para 212.565 em 2014 ( com a respectiva diminuição de despesa ). CONSEQUÊNCIAS NEGATIVAS DAS POLÍTICAS IMPLEMENTADAS NO TEMPO DA TROIKA QUE SÃO EVIDENCIADAS PELO ESTUDO 1) Em média toda a população sofreu cortes no seu rendimento, mas foi bastante pior nos mais pobres que nos mais ricos. 2) As políticas seguidas tornaram a população de Portugal mais desigual em termos de rendimentos. 3) A taxa de pobreza em Portugal aumentou, ou seja os pobres aumentaram em mais de 116.000 pessoas de 2009 para 2014, passando de 1,903 milhões em 2009 para 2,019 milhões em 2014, dos quais 22,2 % eram menores de 17 anos e 17,8 % idosos 4) Aumentou a taxa de privação material em Portugal 5) Os trabalhadores de mais fracos rendimentos, em percentagem, perderam mais que os outros. 6) A população mais necessitada foi prejudicada pela redução das contribuições sociais relativas a abono de família, rendimento social de inserção e complemento solidário para idosos . APRECIAÇÃO FINAL As medidas de redução do défice das contas públicas exigidas pela União Europeia e pelo FMI ( cujos organismos intervenientes constituíram a chamada troika ) para emprestar dinheiro ao Estado Português em consequência da crise financeira internacional de 2009 ( ver 1ª Parte do texto ) estão traduzidas no que foi chamado Memorandum de Entendimento. Aquelas medidas foram postas em prática entre 2011 e 2015 pelo governo de coligação PSD + CDS ( Passos Coelho + Paulo Portas ). A insensibilidade social ( para não dizer crueldade ) das disposições tiveram as consequências acima descritas, mas acabaram por ser ineficazes em relação aos objectivos pretendidos pela troika. No Memorandum estavam fixadas metas para os défices das contas públicas em 2011, 2012 e 2013 que não foram atingidos. Vejamos quais eram os objectivos e os resultados alcançados ANO DÉFICE PRETENDIDO DÉFICE REAL ( valores tirados da Pordata ) Em MILHÕES de € Em % do PIB Em MILHÕES de € Em % do PIB 2011 10.068 - 5,9 13.495 -7,7 2012 7.645 - 4,5 10.400 -6,2 2013 5.224 - 3,0 8.702 -5,1 EM FACE DISTO, COMO É POSSÍVEL AOS INTERVENIENTES E AOS QUE OS APOARAM ESTAREM SATISFEITOS E POR VEZES ORGULHOSOS DOS RESULTADOS OBTIDOS PELO GOVERNO PSD+CDS ?

sexta-feira, 29 de maio de 2020

A CRISE FINANCEIRA INTERNACIONAL DE 2009 E O SEU REFLEXO EM PORTUGAL : CAUSAS , CONSEQUÊNCIAS E IDEIAS ERRADAS PARTE I – CAUSAS e DUAS IDEIAS ERRADAS

A ) Relembrando o que se passou : Em resultado da falência da banco norte americano Lehman Brothers em 2008 ( crise dos sub-prime desencadeada nos EUA) estabeleceu-se grande confusão e desconfiança nos mercados financeiros e os bancos deixaram de emprestar dinheiro. Sem crédito, a actividade económica paralisou e a economia entrou em recessão. Numa 1º fase, que durou pouco, a União Europeia aconselhou os governos a aumentarem a despesas pública a fim de combater a recessão, mas rapidamente mudou de opinião em 180º passando a aconselhar máxima redução de despesas. Países como Portugal viram as falências de empresa crescerem, o desemprego aumentar e as receitas fiscais diminuírem. Como o Estado, desde há décadas ( ver anexos ) já dependia de empréstimos para satisfazer os seus compromissos, o aumento de desequilíbrio entre receitas e despesas, fez aumentar a necessidade daqueles. E como a desconfiança dos investidores financeiros era grande, como acima ficou dito, estes começaram a pedir juros, exorbitantes, incomportáveis para quem pedia emprestado ( foi a crise das dívidas soberanas) O Banco Central Europeu não comprou dívida pública dos países necessitados em quantidade suficiente ( como fez mais tarde Mario Draghi e recentemente Christine Lagarde ) e Portugal em desespero de causa, em situação de quase bancarrota, através do Governo de José Sócrates com a concordância dos partidos da direita, teve de recorrer à União Europeia e ao FMI para obter dinheiro mais barato. O empréstimo teve de obedecer às regras dos emprestadores ( a chamada troika ), as quais foram postas em prática pelo governo que se seguiu ao de José Sócrates, a coligação PSD+CDS ( Passos Coelho + Paulo Portas ). B ) Analisemos agora 2 ideias erradas que na altura tentaram e ainda tentam impingir à generalidade da população : 1) É verdade que a culpa da quase bancarrota do país foi o despesismo do Governo Sócrates e dos governos socialistas em geral ? NÃO ! Basta olhar para o QUADRO Anexo 1 , onde figuram valores tirados dum comunicado da Agência Lusa de 20/3/2008, e para o QUADRO Anexo 2 , onde se reproduzem dados tirados da PORDATA sobre défice e dívida a partir de 1995 para se observar que todos os governos pós Revolução de 25 de Abril de 1974 apresentaram défices nas contas publicas e contraíram empréstimos e que OS DÉFICES MAIS BAIXOS SE VERIFICARAM COM GOVERNOS SOCIALISTAS. Quanto ao défice de 9,9 % do PIB que ocorreu em 2009 com o Governo de José Sócrates, ele foi resultante das consequências da crise financeira internacional acima descritas. De facto o Governo Sócrates podia ter gasto menos dinheiro, se tivesse deixado de pagar subsídios de desemprego, rendimentos sociais de inserção, complementos sociais par idosos e outras prestações sociais. Mas essa solução teria sido a correcta ? Não me parece, nem a ninguém com um mínimo de sentimentos de solidariedade social. Para melhor compreensão, ver o QUADRO Anexo 3 que compara as Contas da Administração Pública de 2008 com 2009 e reparar onde houve aumento de despesa e diminuição de receita No ano de 2010, houve 2 governos, inicialmente de José Sócrates e depois de Passos Coelho. Pelas razões anteriormente avançadas o défice foi de 11,4 % do PIB. Ver Quadro Anexo 4. Confirma-se portanto que os governos do Partido Socialista não foram despesistas. 2) ´E verdade que o Governo de Passos Coelho e Paulo Portas salvou o País ? Não ! Como vimos, o problema do País, resultante da crise financeira internacional, foi o de não conseguir obter empréstimos a juros razoáveis. Ora este objectivo não foi conseguido pelo Governo PSD+CDS, foi resultado dum pedido de auxílio à União Europeia feito Governo de José Sócrates, aprovado por aquela, com a imposição de condições económicas prejudiciais para Portugal ( como a privatização de empresas públicas rentáveis ). O Governo Passos Coelho e Paulo Portas foi apenas o executante dum guião escrito pela troika, baseado em ideias de economia neo liberal . Portanto quem salvou o País foram a UE e o FMI. Mas nunca é demais reafirmar que se o Banco Central Europeu, sob a orientação do Sr. Trichet, tivesse tomado a atitude que mais tarde, sob a direcção do Sr. Mario Draghi, tomou, tudo teria sido diferente. Os resultados para a população portuguesa da dita “salvação “ serão resumidos na PARTE II deste artigo, a partir do excelente estudo “ DESIGUALDADE DE RENDIMENTOS E POBREZA EM PORTUGAL – As consequências sociais do programa de ajustamento “ , da autoria de Carlos Farinha Rodrigues et al , do Instituto Superior de Economia e Gestão, edição de 2016 da PORDATA Lisboa, 29 de Maio de 2020 PORTUGAL - CONTAS PÚBLICAS QUADRO 1 ANO DÉFICE DÍVIDA PÚBLICA Governos em % PIB em % PIB em M Escud 1974 62.809 Gov Provisório 1975 100.340 Gov Provisório 1976 151.379 Gov M Soares 1977 -2,9 210.549 Gov M Soares 1978 -7,2 292.530 Soares et al 1979 -5,1 253.773 Gov Pinto e MLPintasilgo 1980 -7,2 466.918 Gov Sá Carneiro 1981 -8,7 709.702 Gov Balsemão 1982 -7,2 938.834 Gov Balsemão 1983 -5,1 1.302.540 Balsemão e Bloco Central 1984 -5,5 1.773.625 Bloco Central 1985 -8,6 2.343.372 Bloco Central 1986 -7,5 2.858.292 Gov Cavaco 1987 -5,9 3,768.076 Gov Cavaco 1988 -3,6 4.511.583 Gov Cavaco 1989 -2,9 5.180.194 Gov Cavaco 1990 -6,3 5.671.315 Gov Cavaco 1991 -7,6 6.584.002 Gov Cavaco 1992 -4,7 7.048.897 Gov Cavaco 1993 -8,1 8.225.777 Gov Cavaco 1994 -7,7 9.328.602 Gov Cavaco 1995 -5,5 10.509.910 Gov Guterres 1996 -4,8 11.161.220 Gov.Guterres 1997 -4,0 11.365.911 Gov.Guterres 1998 -3,2 11.677.376 Gov.Guterres Os valores do défice foram tirados dum comunicado da Agência Lusa de 20 de Março de 2008 Os valores da dívida foram tirados do livro PORTUGUESE HISTORICAL STATISTICS , ED. INE PORTUGAL - CONTAS PÚBLICAS QUADRO 2 ANO DÉFICE DÍVIDA SOBERANA OBS. m % PIB em % PIB em M de € 1995 -5,2 61,6 54.874,0 Gov Guterres 1996 -4,7 63,1 59.561,0 Gov Guterres 1997 -3,7 58,6 59.928,0 Gov Guterres 1998 -4,4 55,0 61,249,0 Gov Guterres 1999 -3,0 54,8 65.550,0 Gov Guterres 2000 -3,2 54,2 69.592,0 Gov Guterres 2001 -4,8 57,4 77.908,0 Gov Guterres 2002 -3,3 60 85.595,0 Gut e Barroso 2003 -5,7 63,9 93.333,0 Gov Barroso 2004 -6,2 67,1 102.158,0 Barr. e depois Santana Lopes 2005 -6,1 72,2 114.553,0 S.L. e depois Sócrates 2006 -4,2 73,7 122.500,0 Gov Sócrates 2007 -2,9 72,7 127.626,0 Gov Sócrates 2008 -3,7 75,6 135.478,0 Gov Sócrates 2009 -9,9 87,8 154.014,0 Gov Sócrates 2010 -11,4 100,2 179.966,0 Gov Socr. e depois Passos 2011 -7,7 114,2 201.459,0 Gov Passos 2012 -6,2 129,0 217.160,0 Gov Passos 2013 -5,1 131,4 224.078,0 Gov Passos 2014 -7,4 132,9 230.059,0 Gov Passos 2015 -4,4 131,2 235.746,1 Gov Passos 2016 -1,9 131,5 245.244,8 Gov A Costa 2017 -3,0 126,1 247.173,7 Gov A Costa 2018 -0,4 122,0 249.260,8 Gov A Costa 2019 0 117,7 249.980,3 Gov A Costa NÚMEROS TIRADOS DA PORDATA QUADRO ANEXO 3 CONTAS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DE 2008 e 2009 QUADRO ANEXO 4 CONTAS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DE 2010

sábado, 4 de janeiro de 2020

SOBRE O SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE NO FINAL DE 2019

Continua a falar-se muito do SNS. Até o Sr. Presidente da República, na sua mensagem de Ano Novo para 2020 a isso fez referência É natural, pois a par da escolaridade obrigatória e gratuita para todos até ao 12º ano, é uma joia de valor incalculável criada pelo regime democrático resultante da Revolução de 25 de Abril de 1974. É estranho, mas muito raramente aparecem louvores ao SNS : o que se ouve e se lê são críticas ao seu funcionamento neste ou naquele local, à falta de profissionais de saúde, ao envelhecimento dos equipamentos, ao encerramento temporário de algumas unidades, aos tempos de espera para consultas e cirurgias, a dívidas dos hospitais públicos, à existência de taxas moderadoras e também muitas críticas à falta de verbas ( sobretudo para aumentar vencimentos dos profissionais envolvidos ). Sobre a falta de verbas falarei mais adiante, mas antes disso vou fazer as seguintes considerações : As críticas, em meu entender, têm dois objectivos, aliás antagónicos : chamar a atenção para que é necessário melhorar o funcionamento do SNS e/ou desacreditar o SNS para levar as pessoas a fazerem o sacrifício de contratar seguros de saúde. Porem, quanto custará a mensalidade dum seguro de saúde que conceda os benefícios que o SNS concede a cada português , e sem limite de despesa ? Quanto custará ? Respondam, por favor, senhores críticos ! ( Devo dizer que a prática comercial de denegrir os produtos da concorrência em vez de salientar as qualidades dos produtos próprios não se vê em mais nenhum ramo de actividade, excepto na política ). E , já agora, pergunto a quem sabe muito sobre cuidados de saúde e opina nos jornais, nas TVs e através da net, quais são os países da OCDE em que aqueles cuidados são mais -abrangentes dos que os do nosso SMS e também os que na prática funcionam melhor que o nosso ( menos tempos de espera para consultas, cirurgias e exames, menos insucessos fatais por mil habitantes, etc. ). Como são frequentes as referências ao que sucede nos países que queremos emular, esta comparação sem dúvida que se justifica As causas das dificuldades que o SNS atravessa desde 2010 para cá ( embora durante os governos anteriores aos do Sr. António Costa não merecessem tão assiduamente a atenção da comunicação social ) são conhecidas : aumento da esperança média de vida das pessoas sem concomitante aumento da resistência à doença e aos achaques da velhice; crença das pessoas de que vale sempre a pena ir ao médico pois os progressos da medicina são constantes, o que , conjuntamente com a fácil acessibilidade aos cuidados de saúde, faz afluir mais utentes aos serviços ; aumento dos custo dos medicamentes devido à introdução de novos e dispendiosos fármacos - circunstâncias estas que não foram acompanhadas do necessário aumento do financiamento público. E não foram acompanhadas de suficiente aumento de despesa pública porque a seguir à crise financeira internacional que começou nos EUA em 2008 e se propagou para a Europa a economia portuguesa entrou em declínio e as despesas públicas, sob a batuta da troika ( 2011-2014 ) e execução do governo do PSD+CDS, entraram em contracção. É sabido que após uma crise económica, onde as queda são rápidas, a recuperação a níveis anteriores é lenta. Em geral demora anos, com veremos Os gráficos e tabelas, tirados da PORDATA que a seguir se exibem são bem explicativos. No gráfico relativamente à despesa das administrações públicas com a Saúde, vê-se o seguinte : 1. Crescimento a um ritmo mais ou menos constante de 2000 a 2009 2. Abrandamento do ritmo de crescimento de 2009 para 2010 3. Queda muita acentuada de 2010 para 2012. 4. Estabilização entre 2012 e 2014 5. Re-início do crescimento em 2014 que se mantem até 2018 (últimos ano do gráfico ) e que, com se sabe, continuou em 2019. ( Convém não esquecer que todas estas despesas com o SNS foram feitas num contexto de défice nas contas públicas e de aumento da dívida soberana ) Imaginando que não tivesse havido crise económica nem intervenção da troika e que o ritmo de crescimento da despesa das administrações públicas com a Saúde se tivesse mantido ao rimo de 2000-2009, em 2018 aquela teria atingido o valor de 15.200 milhões de euros e não apenas cerca 12.200 como está previsto. Ou dito de outra maneira, a despesa em 2018 teria sido superior em 25% ao que foi !!! E muitas das dificuldades não se teriam manifestado. -Ah! - exclamarão alguns – isso não foi feito porque não houve vontade política de o fazer ! Não quiseram saber do SNS ! Antes de dar a minha opinião sobre esse tipo de comentários, vejamos o que passou com o PIB , indicador que mede a riqueza gerada num país, a partir do quadro tirado da PORDATA , como se disse i) Antes da crise iniciada em 2008, o ponto mais alto do PIB foi atingido em 2008 com 193,450 milhões de euros ii) Iniciou-se então uma queda cujo valor mais baixo foi atingido em 2013 com 178. 169 milhões de euros iii) De 2013 em diante, o PIB voltou a subir tendo finalmente em 2018 sido ultrapassado o máximo anterior de 2008, ou seja FORAM NECESSÁRIOS 10 ANOS PARA SE VOLTAR A VALORES ANTERIORES À CRISE. Voltando ao caso de haver ou não haver vontade política de gastar mais dinheiro com o SNS , não podemos deixar de considerar o seguinte : a) A dívida pública portuguesa é muito, muito elevada e portanto não é do interesse de Portugal continuar a aumentá-la indefinidamente. Há juros a pagar e há que mostrar às instituições europeias que nos ajudam a ter juros baixos que somos um País honrado que quer pagar as suas dívidas e portanto um Estado de confiança b) Para conseguir esse objectivo é necessário que o défice das contas vá diminuindo e tenda para zero. c) O funcionamento de todos os serviços públicos, os rendimentos das pessoas ( ordenados dos funcionários públicos e pensões dos reformados ) e as prestações sociais foram muito prejudicados pela contracção de despesas imposta pela troika e executada pelo governo de então ( PSD+CDS ). d) Não seria justo que todo o dinheiro disponível resultante da melhoria das condições económicas pós-troika fosse canalizado para o SNS. Todos os prejudicados pelas políticas anteriores também tinham direito à reversão. Neste contexto, seria benéfico recorrer aos serviços privados de saúde resolver problemas ? Não me parece, pois não creio que os cuidados prestados pelos privados sejam mais baratos que o custo de iguais cuidados prestados nas unidades do SNS. E como vimos acima, as verbas destinadas à Saúde são as possíveis, considerando todas as circunstâncias. Também não devemos esquecer dois detalhes importantes : no tempo da troika + governo PSD e CDS, o tempo de trabalho dos profissionais de saúde foi aumentado de 35 para 40 h semanais o que possibilitou, com o mesmo pessoal e sem aumento de despesa, mais atendimento aos doentes ; o governo posterior do PS reverteu também esta situação, tendo sido necessário contratar mais pessoal para realizar o mesmo volume de serviço – e isto absorveu uma parte do aumento de verba destinado ao SNS. Para concluir : Pelo que oiço e vejo nas notícias e pela minha experiência como utilizador do SNS, o está verdadeiramente em causa nas queixas são as demoras no atendimento e a necessidade, por vezes, de percorrer maiores distâncias para ser atendido, mas não a qualidade daquele. Pessoalmente continuo convicto de que a qualidade técnica e humana dos serviços prestados pelo SNS ( salvo raras e desonrosas excepções ) é do melhor que se pode obter. Lisboa, 3 de Janeiro de 2020