sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

DEMOCRATIZAÇÃO DA ZONA EURO


 

Zona Euro (ZE) é um subconjunto da União Europeia e portanto uma  associação de países democráticos ( condição sine qua non para pertencer ao conjunto ) que é regida por instituições NÃO- democráticas. Isto é sentido por muitas pessoas e vem detalhadamente explicado num livro recente com o título “Por um Tratado de Democratização da Europa” da autoria de T. Piketty, S. Hennette, G. Sacriste e A. Vauchez, professores e investigadores em França.

Como se sabe, nos países democráticos existe um poder executivo que presta contas e é responsável perante um parla- mento eleito democraticamente pela população.

Segundo o citado livro, na  ZE, isso não acontece : as decisões de quem tem o poder executivo não estão sujeitas a ratificação ou rectificação de nenhum parlamento – tipo de instituição esta que não existe especificamente para a  Zona Euro.

Na ZE, quem toma as decisões são organismos que para responder à crise financeira e económica de 2008 se formaram à margem dos tratados vigentes na EU : o Eurogrupo e a Cimeira dos Chefes de Estado e de Governo da ZE. As decisões são baseadas no trabalho dum poderoso núcleo duro formado a partir das direcções nacionais do Tesouro francesa e alemã, da comissão executiva do Banco Central Europeu, dos altos funcionários da Comissão Europeia, etc. Ao longo duma década o seu campo de acção foi aumentando e inclui hoje as políticas de austeridade ou de consolidação orçamental, a  coordenação das políticas económicas dos Estados, os planos de resgate dos países com dificuldades financeiras, etc.

Em face desta realidade, os autores põem concretamente as seguintes perguntas, e transcrevo da tradução portuguesa :

Quem controla efectivamente a elaboração dos memorandos que impõem reformas estructurais consideráveis em troca da ajuda do Mecanismo Europeu de Estabilidade ? Quem fiscaliza a actividade executiva das instituições que compõem a troika ? Quem avalia as decisões tomadas no âmbito do Conselho Europeu dos Chefes de Estado e de Governo da ZE ?Quem sabe o que está a ser negociado no seio dos dois comités centrais do Eurogrupo, que são o Comité da Política Económica e o Comité Económico e Financeiro ?

Nem os parlamentos nacionais , que na melhor das hipóteses só controlam o seu próprio governo, nem o Parlamento Europeu que foi cuidadosamente posto à margem da governação da ZE.

Para obviar a esta aberrante falta de democracia na ZE, os autores propõem a adopção dum Tratado Democrático para a ZE ( T-Dem ), sem necessidade de alterar a estrutura dos tratados que enformam a União Europeia.

A peça fundamental seria a criação dum parlamento democrático para a ZE, com poderes legislativos e de fiscalização das decisões tomadas pelos órgão executivos. Esse parlamento seria constituído por 4/5 de deputados oriundos de cada país, proporcionalmente ao número dos seus habitantes e respeitando as fracções ideológicas presentes nos parlamentos nacionais, e 1/5 de deputados provenientes do Parlamento Europeu.

Na parte final do livro, é proposto um texto para o tratado.

A proposta parece-me muito interessante no sentido de dotar a Eurozona de instituições que permitam o seu funcionamento democrático.

Recomenda-se a leitura do livro ( são cerca de100 páginas de escrita pouco compacta ) a quem se interesse pela Democracia. E penso que muitíssimas pessoas estarão interessadas neste tipo de mudança. Seria um passo no caminho duma ZE que voltasse a entusiasmar os povos

Não me apercebi que tivesse merecido louvores ou críticas, ou sequer atenção dos habituais comentadores políticos nacionais, . mas como nem leio nem vejo tudo, pode ser que sim…

No contexto da EU também não  li nada, mas provavelmente não mereceu atenção por ser uma proposta de alterações para o funcionamento da ZE “de fora para dentro” e não “de dentro para fora “.E ainda por cima vindo dum grupo de pessoas cuja simpatia pelas políticas económicas neo liberais deve ser zero ou negativas…